Neuropsicólogo
- victornunes88
- 21 de ago.
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Imagina ser o “detetive” do funcionamento do cérebro — alguém que investiga, com método e empatia, como atenção, memória, linguagem, emoções e comportamento se conectam com a saúde e com a aprendizagem. Esse é o trabalho do neuropsicólogo.
Ele atua na interface entre a Psicologia e as Neurociências, ajudando a entender por que certas dificuldades surgem (por exemplo, após um AVC, um trauma craniano, em quadros de TDAH, TEA, dislexia, demências) e qual é o melhor plano para reabilitar habilidades ou adaptar rotinas. O campo ganha relevância no Brasil com o envelhecimento populacional e o aumento do número de pessoas idosas — o Censo 2022 mostrou forte crescimento do grupo 65+ e reforçou a mudança da estrutura etária do país.
Outro vetor é a demência: estudo nacional divulgado pelo Ministério da Saúde em 2024 estimou que cerca de 8,5% da população com 60+ convive com algum tipo de demência, o que representa aproximadamente 1,8 milhão de pessoas hoje e projeção de 5,7 milhões até 2050. Isso cria demanda por avaliação e reabilitação neuropsicológica qualificada — e por profissionais que traduzam laudos em ações de cuidado no SUS, na saúde suplementar, nas escolas e nas famílias.

O que é um Neuropsicólogo
É o psicólogo que se especializa no estudo das relações entre cérebro e comportamento. No Brasil, a Neuropsicologia é especialidade reconhecida pelo Conselho Federal de Psicologia desde 2004, com regras atualizadas posteriormente — o título de especialista pode ser registrado, embora não seja obrigatório para o exercício profissional. Na prática, o título atesta uma formação avançada e padronizada, valorizada por empregadores e editais.
A atuação é ancorada em normas da profissão. A Avaliação Psicológica (da qual a avaliação neuropsicológica é uma modalidade) segue diretrizes do CFP nº 09/2018 e utiliza instrumentos aprovados no SATEPSI — sistema oficial que lista os testes com parecer favorável. Além disso, a avaliação e o uso de métodos psicológicos são função privativa de psicólogas(os), com base na legislação profissional.
O que faz
Conduz entrevistas clínicas e anamnese com a pessoa e familiares/cuidadores.
Seleciona e aplica testes psicológicos validados (atenção, memória, linguagem, funções executivas, etc.), seguindo o SATEPSI.
Realiza observações comportamentais padronizadas durante as tarefas.
Integra resultados de testes, história clínica e exames médicos (quando houver) para formular hipóteses diagnósticas.
Elabora laudos e devolutivas claras, traduzindo achados para a pessoa atendida e para a equipe.
Indica e/ou executa reabilitação cognitiva e estratégias compensatórias personalizadas.
Apoia planos educacionais (adaptações curriculares, orientações à escola e à família).
Participa de juntas clínicas com neurologia, psiquiatria, fonoaudiologia, terapia ocupacional, fisioterapia.
Monitora evolução (retestes periódicos) e ajusta intervenções.
Atua em perícias e avaliações de capacidade quando requisitado judicialmente.
Contribui na triagem pré e pós-cirúrgica (ex.: epilepsia, neurocirurgias).
Produz educação em saúde (psicoeducação para paciente e cuidadores).
No cotidiano, o atendimento costuma ocorrer em múltiplas sessões: triagem, testagem (geralmente de 2 a 6 encontros, dependendo da demanda), devolutiva e, se indicado, um programa de reabilitação cognitiva. A escolha dos instrumentos é criteriosa — somente testes aprovados e atualizados podem ser utilizados, conforme o SATEPSI. A devolutiva é um momento-chave: além de explicar resultados, o neuropsicólogo entrega recomendações práticas para escola, trabalho e vida diária.
Responsabilidades
Respeitar o Código de Ética e as diretrizes de Avaliação Psicológica (CFP 09/2018).
Utilizar apenas instrumentos aprovados e atualizados no SATEPSI.
Garantir consentimento informado, sigilo e guarda adequada de registros.
Formular hipóteses baseadas em evidências, evitando conclusões além dos dados.
Elaborar laudos técnicos claros e úteis para a tomada de decisão clínica/educacional/jurídica.
Atuar interdisciplinarmente, mantendo comunicação com outras especialidades.
Promover acessibilidade (adaptações para pessoas com deficiência sensorial/motora).
Manter formação continuada (supervisão, cursos, leitura científica).
Orientar família e cuidadores, reduzindo estigma e favorecendo adesão.
Registrar evolução e resultados para avaliar efetividade das intervenções.
Zelar pela qualidade técnica (controle de ambiente, padronização de aplicação).
Evitar conflito de interesses em perícias e avaliações para terceiros.
Essas responsabilidades garantem validade e fidedignidade do processo. O descumprimento das diretrizes de avaliação e o uso inadequado de testes podem configurar infração ética e administrativa perante o CFP/CRP.
Áreas de atuação
Clínicas e consultórios (avaliação e reabilitação).
Hospitais e centros de reabilitação (neurologia, neurocirurgia, geriatra, pediatria).
Saúde mental (psiquiatria, CAPS, ambulatórios especializados).
Contexto escolar (apoio a adaptações pedagógicas, interface com psicopedagogia).
Perícias e Justiça (capacidade civil, interdições, nexo causal).
Pesquisa e docência (universidades, laboratórios, ensaios clínicos).
Saúde ocupacional (retorno ao trabalho, recomendações de adaptação).
O trabalho pode focar adultos e idosos (AVC, TCE, epilepsia, esclerose múltipla, demências) ou crianças e adolescentes(transtornos do neurodesenvolvimento como TDAH, TEA, dislexia e quadros genéticos). Em todos os cenários, a avaliação é psicológica por natureza, sustentada por testes validados e regras profissionais — com qualificação específica exigida pelos Conselhos para evitar interpretações equivocadas.
Como se tornar um
Graduação em Psicologia (bacharelado) e registro no CRP. Somente psicólogas(os) podem realizar avaliação psicológica no Brasil.
Formação específica em Neuropsicologia (pós-graduação lato sensu, residência, cursos com supervisão). Procure trilhas com carga horária robusta, prática supervisionada e discussão de casos. Guias e manuais do CFP ajudam a reconhecer boas práticas na área.
Título de Especialista (opcional, recomendado). O Registro de Especialista é regulamentado (Resolução CFP nº 23/2022) e qualifica sua formação; o CFP disponibiliza as condições e rotas (prova, comprovação de experiência/formação). Não é obrigatório, mas agrega credibilidade em concursos e hospitais.
Domínio de Avaliação Psicológica. Estude as diretrizes da Resolução CFP 09/2018 e mantenha-se atualizado no SATEPSI, que lista instrumentos favoráveis, em avaliação ou desfavoráveis.
Rede e desenvolvimento contínuo. Participe da SBNp (Sociedade Brasileira de Neuropsicologia), congressos, grupos de estudo e supervisões — caminhos clássicos para aprofundar repertório, publicar casos e fortalecer a ética da prática.
Habilidades necessárias para a profissão
Raciocínio clínico e pensamento hipotético-dedutivo.
Atenção a detalhes (padronização de aplicação, registro minucioso).
Comunicação clara (traduzir achados técnicos para linguagem acessível).
Empatia e escuta ativa (com a pessoa atendida e com a família).
Conhecimento sólido de psicometria e de funções cognitivas.
Trabalho interdisciplinar (integração com neurologia, fono, TO, psiquiatria).
Ética e postura investigativa (evitar vieses, respeitar limites de inferência).
Planejamento e organização (agenda, relatórios, guarda de documentos).
Atualização constante (novos testes, evidências, tecnologia).
Salário médio
A remuneração depende de região, setor (público/privado), carga horária, experiência e titulação. Em bases nacionais:
Salario.com.br (CBO 2515-45 Neuropsicólogo) apresenta piso/mediana/teto para 2025, com cortes por estado, porte da empresa e setor. Útil para balizar propostas CLT.
Dissidio.com.br compila pisos por convenções e reajustes locais para o mesmo CBO. Bom para verificar piso regional quando houver acordo coletivo.
Quero Bolsa agrega dados de mercado e aponta média nacional em torno de R$ 3,3 mil/mês, variando por UF; lembre-se: é estimativa construída com múltiplas fontes.
Glassdoor mostra a média relatada de cerca de R$ 3,1 mil/mês para “Neuropsicólogo”, com forte variação por local e empregador (dados autorrelatados).
No setor privado e em clínicas próprias, a renda pode ser maior e ligada ao volume de atendimentos; em hospitais/universidades, pesam planos de carreira e benefícios. Avalie o pacote total (fixo + variáveis + benefícios + capacitação).
Local e ambiente de trabalho
O ambiente demanda silêncio, controle de estímulos e padronização. A sala de avaliação precisa ter mesa, cadeiras confortáveis, boa iluminação e condições para aplicação de testes (protocolos, cronometragem, materiais específicos). Em hospitais, o trabalho inclui leitos, UTIs e ambulatórios, exigindo coordenação com horários de medicação e exames. Em centros de reabilitação, a agenda alterna testagem, devolutivas e sessões de reabilitação (individuais ou em pequenos grupos).
Há interface constante com equipes multiprofissionais.Documentação e sigilo são cruciais: laudos e protocolos devem ser armazenados com segurança, e o uso de instrumentos precisa seguir as regras do SATEPSI e das Resoluções do CFP. Em contextos escolares, a comunicação com famílias e docentes amplia o impacto dos achados, sempre respeitando consentimento e ética profissional.
Mercado de trabalho
O cenário é favorável e com tendência de expansão. Três forças puxam a demanda:
Envelhecimento da população: o Brasil tem mais de 32 milhões de pessoas com 60+, representando 15,8% do total — e crescendo. Com isso, aumentam os casos de comprometimento cognitivo leve e demências, que pedem diagnóstico diferencial, orientação às famílias e planos de estimulação/reabilitação.
Doenças neurológicas prevalentes: o AVC segue como uma das principais causas de morte e incapacidade; associações médicas relatam dezenas de milhares de óbitos anuais e alta carga de sequelas, inclusive em pessoas abaixo de 70 anos. A reabilitação cognitiva e o acompanhamento neuropsicológico pós-AVC tornam-se peças centrais na qualidade de vida e no retorno ao trabalho.
Educação e neurodesenvolvimento: escolas e famílias buscam, cada vez mais, avaliações bem fundamentadaspara TDAH, TEA, dislexia e altas habilidades. Isso exige profissionais com domínio técnico, laudos claros e capacidade de dialogar com educadores para orientar intervenções pedagógicas e adaptações curriculares.
Onde estão as oportunidades?
Hospitais gerais (neurologia, geriatria, neurocirurgia) e centros de reabilitação (pós-AVC, TCE, demências).
Clínicas especializadas em TEA/TDAH, aprendizagem e linguagem.
Serviços públicos (SUS/ CAPS/ ambulatórios de especialidades) — muitos editais pedem formação específica, e o título de especialista ajuda na classificação.
Perícia e Justiça (capacidade civil, interdição, benefícios previdenciários).
Ensino e pesquisa (graduação, pós e projetos clínicos).
Saúde corporativa (readaptação funcional, ergonomia cognitiva, programas de prevenção).
Tendências
Padronização e qualidade: a Resolução CFP 09/2018 consolidou parâmetros para a Avaliação Psicológica e reforçou o papel do SATEPSI — o que eleva a exigência técnica e a confiança de quem contrata.
Profissionalização da carreira: o Registro de Especialista (Res. 23/2022) oferece trilhas para comprovar competências. Junto a isso, a SBNp promove certificação própria (não substitui o título do CFP) e eventos de atualização, fortalecendo a comunidade e a visibilidade da área.
Alta demanda em demências: com 1,8 milhão de pessoas já afetadas e projeções de multiplicação até 2050, cresce a necessidade de equipes de memória e centros de referência com neuropsicologia integrada.
Integração com tecnologia: prontuários eletrônicos, plataformas de telessaúde e ferramentas digitais de treino cognitivo abrem frentes de atuação — sempre observando ética, sigilo e limites de validade dos instrumentos (nem todo “app” é teste psicológico!).
Como se destacar
Monte um portfólio com relatórios (anônimos), protocolos comentados e casos supervisionados; mantenha uma biblioteca de testes atualizada segundo o SATEPSI; busque supervisão contínua e participação ativa na SBNp(congressos, newsletters, grupos). Isso encurta o caminho para vagas em hospitais, clínicas de alta complexidade e editais.
Perguntas frequentes sobre a profissão
Preciso ser psicólogo para atuar como neuropsicólogo? Sim. Avaliação e uso de testes psicológicos são atos privativos de psicólogas(os) no Brasil. A especialização em Neuropsicologia complementa sua formação para atuar com segurança.
O título de especialista é obrigatório? Não. O Registro de Especialista (Res. 23/2022) não é exigência legal, mas qualifica seu currículo e pode ser diferencial em hospitais, concursos e convênios.
Quais testes posso usar? Somente aqueles aprovados no SATEPSI (lista viva). Consulte sempre a situação do instrumento antes de aplicar
Quanto tempo dura uma avaliação?
Varia conforme a demanda e o perfil da pessoa, mas geralmente envolve múltiplas sessões (entrevista, testagem, devolutiva). Em hospital, pode haver protocolos abreviados. O essencial é qualidade e padronização.
Links e vídeos úteis
Resolução CFP nº 02/2004 – Reconhece a Neuropsicologia como especialidade. (CFP)
Registro de Especialista (Res. 23/2022) – como obter, dúvidas e cursos. (CFP)
Resolução CFP nº 09/2018 – Diretrizes de Avaliação Psicológica. (crpms.org.br)
SATEPSI – Sistema de Avaliação de Testes Psicológicos (lista e FAQ). (SATEPSI)
SBNp – Sociedade Brasileira de Neuropsicologia (site institucional). (sbnpbrasil.com.br)
IBGE – Censo 2022 (envelhecimento da população). (Censo Demográfico 2022 - IBGE)
Ministério da Saúde – panorama nacional de demências (2024). (Serviços e Informações do Brasil)
SBAVC – Números do AVC no Brasil. (avc.org.br)




artigo muito bem detalhado e explicado